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Retorno à estação. Quando não
a encontro – nunca a encontro – coloco outra em seu lugar. A sucessora, rapidamente, já não difere em nada da original. Porque essa imagem exata, variável em tudo menos nisso, me faz ver a dimensão
dos danos. De como era quando eu não estava lá ou é prova irrevogável de que,
em verdade, nunca estive. Os trilhos em desuso, erva daninha sobre o ferro ocre, placas indicando destinos esquecidos. Poeira sobre os bancos de madeira densa, o trabalho silencioso dos insetos ruindo tudo que provisoriamente se sustém. Às vezes acordo de madrugada só para visitá-la mais
uma vez. A prova. Passo os dias alternando entre visitas à antiga estação e forjando listas de urgências. Segunda: aparar o mato.
Terça: trocar as fechaduras. Quarta: dar telefonemas. Deixar tudo sob um controle provisório enquanto,
no íntimo, estremece-me a beleza das arestas. Quinta: verificar vazamentos.
Sexta: perder as chaves e pegar no sono do lado de fora. Nunca compreendias. Falavas de encaixes, da importância
das ondulações. Falavas mais ainda dos banhos de rio, pular ou passar por baixo
das cercas, essas águas vindas de altitudes, de poços profundos ou de geleiras
que nunca vi. Eu te dizia dos cumes, dos pontos de irremediável variação: vésperas, esquinas, agulhas. Investíamos em imprecisas direções. Eu me
entregava à fúria das ruas, empilhamentos e terrenos baldios, rumores dos êxodos
e a quietude das multidões. Tu fazias pequenas caminhadas à beira-mar. Voltavas
sempre recendendo à maresia, à vida misteriosa e frágil. Eu mantinha as gavetas
lacradas, costurava botões extras nas extremidades das fendas, estendia o comprimento dos
tecidos, cortinas, saias, lençóis. Um pudor todo forjado no medo de perder a sensação do obscuro. Solos lunares, maquinarias movidas a vento, radares
sensíveis aos tremores terra, o que te fazia querer voltar. Mas no dia
certo colocarei na minha lista a tarefa de esquecê-lo. Sabotarei motores,
inverterei certezas, revelarei imprecisões. Compreenderei que mais se preserva quanto mais se ignora. Mistério que faz coincidir o porto e a tormenta. Perigo que ampara, ameaça de toda mansidão.
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