terça-feira, 30 de agosto de 2011

meu deus, se eu tiver que pedir uma coisa só, me livra primeiro dessa vontade de falar de mim. depois, me faz mais pedra, mais ponta, mais sal. arranca de mim esse medo, me livra da ternura vazia, espanta a leveza de mim. ou então transforma minha solidão em pano, e me envolve, me cobre, me veste: faz do meu medo uma pele. e, se eu merecer, me dá olhos escuros, me mostra um silêncio mais fundo, me ensina outra alegria, uma que não seja tão parecida com a dor. eu queria também amar coisas mais fáceis, se for da minha sina e do meu merecimento. queria menos livros e mais janelas. um vestido com menos pano, um corpo com menos receio de ser só corpo. um corpo mais físico, entende. queria também sentir um amor mais justo, um de querer menos, de aceitar mais. me ampara também quando eu tiver medo de ser rasa, me conforta quando eu for bruta e sem jeito. me afasta de tanta perplexidade, meu deus. me faz simples, me faz chão, me faz terra. faz de mim também um lugar bom para o choro, me dá uma linha mais firme, um bordado mais limpo. e, se ainda puder, coloca mais do mundo em mim, me tira um pouco do prazer da solidão e do amor pela estranheza, me dá mais vontade de sentar à mesa, de sorrir sem felicidade, de dar as mãos por gentileza. por fim, eu peço uma vida mais limpa, mais centrada em si mesma, sem tanto medo do que não existe, sem tanta paixão pelo ar.






2007

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