quinta-feira, 16 de junho de 2011

Amor Monstro

para Jarina Menezes


Menina da terra rachada, dos corpos rachados, do nome de galho e de santa de altar. Mulher-maga, devota dos bichos, da lama, do sal. A vida te arde, te despedaça, te empurra para as beiras, para os limite de um corpo de pé. Quando deitavas, tinhas saudade do mar? Mulher-horizonte, tua pele marcada de sonos profundos, o mosqueteiro leve sobre a cama, tua pele pesando na mesa, teus olhos queimados de sol. Os filhos te saindo do corpo, a carne dos teus filhos sobrando no mundo, teu amor-rabisco, teu fôlego de apneias, de boca a boca com os sustos. Teus dedos sempre prontos a dar de beber aos apetites escuros do mundo, tuas mãos doloridas de tanto gestar. Fazer tudo nascer de dentro do nada, esse é teu dom. Víscera escancarada, te escondes na ferida aberta. Fazes da falta uma sobra, de um corpo arrebentado, um arquipélago de peles em uma cama de magma. Teus gestos-golpe se propagam, tuas mãos se revestem de mundo. Tens parentesco com todas coisas que sentem. Não escondes teus remendos, teus veios profundos, fazes dos espaços ocos tuas catedrais, o estômago é um templo, a boca uma cova profunda, onde tudo descansa e renasce, mastigado e feroz. Nascer foi tua maior lição: vida é movimento pra fora, expulsão, força que não se faz sozinho, nostalgia da víscera, é gritar para poder respirar. Nascer é inevitável. E teus desenhos, inevitáveis, nasciam. E nascias junto deles, nascias mil vezes por ano, celebravas todas tuas idades em cada desenho teu. Todos os teus corpos, tuas peles lisas e tuas peles tortas, todas juntas tramadas em cada figura nascida. E teus seres te escapavam pelos poros, elefantes reis dinossauros gatos mitologias sereias pássaros vermes monstros minotauros pétalas intestinos corvos nuvens infernos lábios, tua pele peneira de poros imensos, por onde tudo pode passar. Teus seres monstruosos, feito da beleza das coisas sem avesso, que tem as vísceras como pele. Teus monstros são como os gestos de amor, coisa toda pulsante que sangra, vive e não se estanca, que é a carne dando cambalhotas em si mesma, convulsa sem sair do lugar. Teus monstros transladam, revolucionam, orbitam, estáticos, são carne toda pedra, fibras de fóssil, coração pulsante de um cometa cadente.

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