quinta-feira, 22 de novembro de 2012



Aos caminhantes:

Desata. Recebe do tempo o sentido dos nossos passos mansos. Já é tarde e não nos conhecemos. Caminhamos pela noite, eu sei que prendes teu corpo a um centro. Desprende. Estamos longe de qualquer destino, o centro é o céu da minha boca perdido sob a notícia de um céu maior. Nada nos acolhe, nenhuma âncora, nenhuma direção. Toco o teu braço apenas para que adivinhes: não há motivo para estarmos aqui, o que nos trouxe foi a febre de nossas pernas. Atravessa meu pensamento uma perigosa intenção: que meu mais antigo destino seja o meu  inesperado ardor. Não há nada que nos preceda, nenhuma secreta conjunção: essa intricada sorte que nos enreda é filha de nossos ímpetos ainda há pouco indecorosos. Sentes a lentidão morna que nos protege, essa comunhão violenta e imprópria com tudo que tem finitude? Esse é o risco que corremos quando abençoamos nossos pés com uma desmedida vontade de ir. Magia é coincidir ato com apetite, e em estado de magia os bons corpos se encontram.