desde aquele dia: sonhar com trampolins, mar aberto, correnteza. aquele abraço tão brutal porque exato. que me cortou ao meio, que me fez querer voltar, que me ofereceu tudo sem prometer coisa nenhuma. mesmo agora, a um oceano de distância, mesmo quando te tocava, mesmo antes de te conhecer. agora sem pistas do teu paradeiro, mas de alguma forma ainda estamos dançando ao relento. mãos dadas e os pés entrelaçados sob um céu escuro, sob uma tenda armada em solo estrangeiro, sob um ventilador de teto. but lovers are strangers e eu assisto a uma copilação de saltos ornamentais. me prende sem alívio aquele instante que separa a preparação do salto propriamente dito. o segundo em que o mergulhador precisa se desfazer de si e tornar-se pura queda rumo ao imprevisto. todo desejo de conservação subitamente se transmuta em vontade de vertigem. desde aquele dia quero te contar sobre lançar-se no que não se distingue, sobre os banhos de mar à meia-noite. a praia tomada por crianças, amantes, todo tipo de criatura voraz. porque só os que muito desconhecem é que podem desejar, because lovers are strangers, porque é preciso ser criança, amante, bicho para lançar-se no vazio com o peito aberto. me lanço agora nesses dias sem você e os preencho de magia simples: sentir o pulso de um coração que não o meu, depositar moedas no cruzamento de duas estradas, tirar todos os espinhos de uma flor, dar de beber a quem tem sede. é assim que aciono algumas engrenagens invisíveis, mas o mistério segue inviolável. hoje um amigo veio aqui em casa contar que sonhou comigo. eu chegava de jangada em são paulo (são paulo tinha praia) e avisava que estava dando uma volta ao mundo nessa frágil embarcação. e quem é que não está? afinal lovers are strangers, estamos todos a um pulo do que sequer imaginamos. o que precisamos é manter a fúria, a coragem e a fé. fúria para mover o mundo. coragem para se fazer estrangeiro em relação a si. fé nos mergulhos, esse outro nome para nascer e então nascer de novo.